quinta-feira, 30 de julho de 2009

Aspectos jurídicos da Lei Nº 11.340 de 2006

Aspectos jurídicos da Lei Nº 11.340 de 2006 (Brasil)
Mara Da Silva Ribeiro ribmara@gmail.com

Introdução
Gênese da discriminação; contra a mulher
Da violência doméstica e familiar
Distinção de genero e orientação sexual
Sujeitos ativo e passivo
Formas de lesões corporais leve
Inaplicabilidade da lei dos juizados especiais criminais
O artigo 129 § 9º, do CP. crimes praticados contra a mulher: natureza da ação
Aspectos constitucionais da Lei 11.340/2006
Possibilidade de prisão preventiva
Aplicação instituto da fiança na Lei 11.340/2006
Ação policial em face da nova lei
Medidas protetivas de urgência
Atuação do ministerio público
Competencia jurisdicional
Referências
1 INTRODUÇÃO
A mulher ao longo da história vem sofrendo discriminação, quase sempre vitimizada por agressões no recesso do seu lar, com origem em uma imagem negativada por uma sociedade machista, que não admitia o seu progresso e a colocava na condição de um ser de segunda categoria.
Os movimentos feministas eclodiram, no sentido de conquista de espaço e valorização da mulher, ainda que com ardor em seu combate, não foi suficiente para nivelar ou erradicar as desigualdades no mundo, encontrando óbice dada as diversidades de culturas, religião e atividades legiferantes de cada Estado Nacional.
No Brasil, infelizmente foi necessário um crime vil e repugnante, tendo como sujeito passivo a Senhora Maria da Penha Maia Fernandes, que sofrera tentativa de homicídio perpetrada por seu marido Marco Antonio Heredia Viveiros, restando paraplégica. A despeito da existência de inúmeras “Marias da Penha”, Lei nº 11.340 (2006) a referida senhora foi o suporte de uma luta perante a Corte Internacional de Justiça, que acabou dando ensejo a legislação penal mais rigorosa na repressão aos delitos que envolvessem as diversas formas de violência doméstica e familiar contra a mulher (GIORDANI, 2006).
Desta liça, ingressou no nosso sistema jurídico pátrio, no dia 7 de agosto de 2006, com vigência em 22 de setembro do mesmo ano, a Lei nº 11.340, batizada “Lei Maria da Penha”, cujo apelido inquestionavelmente a acompanhou. A retrocitada lei cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra mulher.
A Lei supramencionada veio rechaçar totalmente a violência de gênero com medidas penalizadoras e protetivas de urgências em consonância com o art. 5º, I, 226 § 5º e 8º da Carta Política, revogando todas as normas infraconstitucionais que estabeleciam dessequiparações com base no critério homem e mulher, portanto os comandos emanados da lei já mencionada, visam eliminar os desníveis de tratamento em razão do sexo.
A lei sob estudo há de ser implementada com políticas publicas eficiente para coibir e erradicar a violência doméstica, especialmente aquela contra os integrantes mais fragilizados da estrutura familiar- mulher, idosos e crianças.
Espera-se que não seja somente o direito penal o ramo jurídico mais convocado para implementar os objetivos da novel Lei, por ter ele maior força coativa, custo menor e imediatista do que as políticas públicas.
2 GÊNESE DA DISCRIMINAÇÃO CONTRA A MULHER
O tema de enfrentamento é dos mais complexos, pois trata-se de discriminação de gênero que protrai no tempo, e inclusive se nos reportarmos à origem desta discriminação constatar-se-à até mesmo em passagem bíblica, mais precisamente na criação do mundo. No Capítulo Gênesis a mulher aparece como causadora de todos os males existente, quando induzida por uma serpente incutiu na mente do homem o desafio de provar o fruto da árvore proibida, que fora a causa da imposição do castigo do Criador, e a partir de então o homem que teria sido criado para a posteridade passaria a provar todas as agruras e conheceria a morte, é o que se depreende do capitulo 3 “A queda do homem”, versículos 6, 7, 22, 23, 24, que estão assim consignados:
6 - Vendo a mulher que a árvore era boa para comer, agradável aos olhos, e arvore desejável para dar entendimento, tomou-lhe do fruto e comeu, e deu também ao marido e ele comeu.
7 - Abriram-se, então, os olhos de ambos; e percebendo que estavam nus, coseram folhas de figueira, e fizeram cintas para si.
22 - Então disse o Senhor Deus: Eis que o homem se tornou como um de nos, conhecedor do bem e do mal: assim para que não coma e viva eternamente:
23 -O Senhor Deus, por isso, o lançou fora do jardim do Éden, a fim de lavrar a terra de que fora tomado.
(Bíblia Sagrada-p. 9,10)
O Escritor Português Eça de Queirós, em sua grande produção literária “O Crime do Padre Amaro” romance que inaugurou o Realismo/Naturalismo na língua portuguesa, ao focalizar criticamente a igreja e o celibato clerical, deixou claro a visão sobre a malignidade da mulher que era propagada por uma sociedade hipócrita e de falso moralismo, quando assim consignou:
Quantas vezes ouvira, nas prédicas, o Mestre de Moral falar, com a sua voz roufenha, do Pecado, compará-lo à serpente e com palavras untuosas e gestos arqueados, deixando cair vagarosamente a pompa melíflua dos seus períodos, aconselhar os seminaristas a que, imitando a Virgem, calcassem aos pés a serpente ominiosa! E depois era o mestre de Teologia mística que falava, sorvendo o seu rapé, no dever de vencer a Natureza! E citando S. João de Damasco, S. Crisólogo, S. Cipriano e S. Jerônimo, explicava os anátemas dos santos contra a Mulher, a quem chamava, segundo as expressões da Igreja, Serpente, Dardo, Filha da Mentira, Porta do Inferno, Cabeça do Crime, Escorpião [...] (PORTO,1964. p. 36).
Corroborando com o exposto, a citação de Beissman, abaixo transcrita:
No Brasil, dados históricos relativos ao Período Colonial revelam que já na ordenação do reino “[...] era permitido aos maridos ‘emendar’ suas companheiras pelo uso da chibata”. Portanto, as agressões físicas e psicológicas imputadas às mulheres ”[...] fazem parte de nossas raízes culturais, trazidas pelos colonizadores europeus e reforçadas no século passado pelas idéias do positivismo de Auguste Comte (1798 -1857) (BEISSMAN, apud GIORDANI, 2006, p. 68).
Para Giordani,
Na política monárquica, a autoridade do homem pretendia ser divina e marital ao mesmo tempo, isto é, para reafirmar a autoridade do rei era preciso confirmá-la na menor célula da sociedade, a família. Desse modo, a mulher devia ser submissa ao marido/ senhor e guardiã dos filhos. Conforme Badinter apud Rifiotis (1997), aos poucos a acusação de malignidade da mulher foi abandonada e consolidou-se um sentido de fraqueza e invalidez correspondente a imperfeição e a deformidade feminina. Porém no século XVII e XVIII, as mulheres, principalmente aquelas que tinham recursos, tentaram se desvincular das funções de esposa e mãe, declinando de seus deveres domésticos (2006, p. 69).
Quando no começo do século XX, Freud falou da natureza feminina, atribui-se às suas descobertas uma dimensão universal sem se aperceber que suas idéias sofriam influências de preconceitos de sua época (GIORDANI, 2006, p. 72).
O psicanalista austríaco e seus discípulos referiam-se à passividade, ao masoquismo e ao narcisismo da mulher e, com a disseminação dos conceitos da psicanálise, ela era aconselhada a se sacrificar no cuidado de seus filhos, como se esse fosse um caminho natural. Pregava-se, ainda, a nítida distinção de papéis maternos dos papeis paternos para a boa formação do “eu” na criança, cabendo à mãe os cuidados com o filho em seus primeiros anos. Ela era orientada a sentir prazer com isso, excluindo de sua vida quaisquer outros interesses, e a presença simbólica do pai já era considerada suficiente. Nesse sentido, a responsabilidade e o poderio maternos aumentaram, enquanto os paternos diminuíram: o papel do pai limitou-se a ser o de mantenedor da família e o patriarcado familiar foi sendo substituído pelo patriarcado estatal.
No Brasil, em 1910, o Partido Republicano Feminino foi criado para que as mulheres pudessem expressar suas opiniões, lutando por sua emancipação no setor de prestação de serviços e no sufrágio 89, feminino. Logo após as mulheres terem adquirido o direito ao voto em 1932, ele, foi suspenso em nível nacional até o ano de 1945, posto que o Congresso Brasileiro foi fechado pelo então Presidente da República Getulio Vargas (GIORDANI, 2006, p.73).
De Souza et al. (2000) e Louro (2001a) afirmam que, mesmo com a volta da democracia no Brasil, após o Golpe Militar de 1964, o movimento feminista fez pouco progresso até o início dos anos 1970 (GIORDANI, 2006, p.73).
3 DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR
A Lei nº 11.340/06 contém dispositivos especializantes, que são os artigos 5º e 7º, definindo o que constitue violência doméstica e familiar contra a mulher, contemplando a vis corporalis, psicológica, patrimonial, sexual, moral, deixando explicitado que a violência doméstica é aquela sem vínculos parentais e a violência familiar entre parentes e pessoas com vínculos afetivos.
A despeito da distinção já está devidamente evidenciada nos artigos suso mencionados, ainda assim é importante citar posicionamento que robustece e rechaça qualquer dúvida, sobretudo que enunciado por Fabrício da Mota Alves, assessor parlamentar no Senado da República, o qual, registrando o testemunho de quem assistiu aos debates que antecederam a aprovação da Lei nº 11.340/2006, afirma que o inciso I do artigo 5º da referida lei, abrange, inclusive, agressões perpetradas contra empregadas domésticas, o que defluiria da dispensa do vínculo familiar e da possibilidade de agregação apenas esporádica das discussões à aprovação de uma proposta concreta de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher (CUNHA; PINTO, 2007).
Para caracterização da violência mister se faz a presença simultânea e cumulativa de qualquer dos requisitos do artigo 7º, cumulados com os pressupostos do artigo 5º, da lei predita.
3.1 REFLEXOS EM OUTRAS ESFERAS DO DIREITO
Os artigos 5º e 7º descrevem condutas que caracterizam motivos para separação com atribuição de culpa e geração dos efeitos legais pertinentes, especialmente aqueles relativos ao direito de guarda dos filhos, posse dos bens do casal até a última ação da partilha e eventual direito à pensão alimentícia. Ademais, comportamentos subsumíveis nas hipóteses dos artigos 5º e 7º autorizam o deferimento de medidas cautelares de proteção da mulher e, alguns casos, da prole e do patrimônio do casal, ainda que não caracterizem, rigorosamente, condutas penalmente típicas, porquanto a Lei nº 11.340/06 não é exclusivamente penal, mais uma lei mista, idônea a influenciar também o direito civil, processual e administrativo.
Vê-se com clareza meridiana que os artigos mencionados não configuram tipos penais incriminadores, mais sim normas não-incriminadoras do tipo explicativos.
4 DISTINÇÃO DE GÊNERO E ORIENTAÇÃO SEXUAL
O parágrafo único do artigo 5º da lei sob exame traz em seu comando “As relações pessoais relacionadas nesse artigo independem de orientação sexual”, gerando fortes polêmicas, uma vez que, a redação é intrincada e pouco esclarecedora dando ensanchas a interpretação ampliativa de que estaria reconhecendo as relações homoafetivas, advindo daí um novo conceito de família. Para Maria Berenice Dias, desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), (PORTO, 2007), uma vez que a violência de que trata a Lei nº 11.340/06 é aquela que se dá no ambiente doméstico e familiar. Resulta óbvio que a lei ao desconsiderar a orientação sexual da vítima para os fins de sua proteção, está reconhecendo a família formada de mesmo sexo que já não pode mais ser considerada apenas sociedade de fato. E chega a afirmar que:
No momento em que é afirmado em que está sob o abrigo da lei a mulher, sem se distinguir sua orientação sexual, alcançam-se tanto lésbicas como travestis, transexuais e transgêneros que mantém relação intima de afeto em ambiente familiar ou de convívio. Em todos esses relacionamentos como nos transgêneros feminino justificam especial proteção (PORTO, 2007, p. 35).
Ao que parece a lei alterou profundamente o conceito de “família”, reconhecendo como entidade familiar as relações homoafetivas.
4.1 CONCEITOS DE TRAVESTIS, LÉSBICAS E TRANSEXUAIS:
Para complementar este opúsculo, mister se faz buscar os conceitos do que seja travestis, transexuais e lésbicas, e posteriormente entender o alcance da norma sob apreciação, sobretudo em face do principio da reserva legal.
Os conceitos de travestis e lésbicas segundo o sexólogo Cláudio Picarzio (2006) são os seguintes:
a) Travestis: ‘Já com os travestis, a coisa é um pouco diferente mas num nível fundamental. Não se sabe ainda como, nem por que, mas os travestis não tem uma identidade só, masculina ou feminina. Eles tem as duas. Eles se sentem homem e mulher, os dois conceitos se misturando dentro deles como ingredientes num liquidificador. Ora eles se sentem mais femininos, ora mais masculinos, mas ambas estão sempre presente e eles não tem o desejo de anular nenhum dos dois lados. Infelizmente, seus corpos nascem com apenas um sexo – homens ou mulheres. O que eles fazem então? Adaptam o seu corpo para alcançar, o máximo possível, essa outra metade da essência deles que veio faltando. Os que nascem homem, a maioria, querem por peitos e quadril, etc...’ Normalmente os travestis optam em não efetuarem cirurgia de mudança de sexo, permanecendo com o órgão genital masculino, já que se sentem completos sendo homem e mulher ao mesmo tempo.
b) Lésbicas: ‘lésbica é o termo utilizado para se referir as mulheres que possuem orientação sexual. Nas palavras do sexólogo Cláudio Picarzio’, orientação sexual tem a ver com desejo, com atração. Com quem você quer ir pra cama? Com alguém do seu sexo? Com alguém do sexo oposto? Tanto faz? São três respectivamente: homossexual, heterossexual e bissexual.
c) No tocante aos transexuais, o conceito nós é dado pela resolução nº. 1652 do Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais, que está assim redigido em seu artigo 3º acima ‘que a definição de transexualismo obedecerá, no mínimo, aos critérios abaixo enumerados: 1) desconforto com o sexo anatômico natural; 2) desejo expresso de eliminar os genitais, perder as características primarias e secundarias do próprio sexo e ganhar a do sexo oposto; Permanência desses distúrbios de forma continua e consistente por, no mínimo, dois anos; 4) ausência de outros transtornos mentais’.
A doutrina predominante discorda da eminente desembargadora Maria Berenice Dias, mormente que a nossa Carta Política em seu artigo 226 reconhece como entidade familiar a união entre homem e mulher, que vem repetida no artigo 1.723 do Código Civil de 2002, impossibilitando a união de pessoas do mesmo sexo. Verbi gratia o entendimento esposado por Cunha e Pinto (2007), aduzindo que as medidas previstas nesta lei aplicam-se também às uniões homossexuais, mas são cuidadosos em restringir seu âmbito apenas àquelas entre mulheres.
Ao que parece não poderia ser de forma diversa, pois indubitavelmente a lei tem força cogente somente para a violência no gênero da pessoa e o destinatário da proteção da norma legal é a mulher, em observância ao princípio da reserva legal, definido no artigo 1º do Código Penal Brasileiro e inscrito com garantia constitucional no artigo 5º, XXXIX, da Carta Magna: “Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. Sendo vedado, portanto, a aplicação da analogia in malam partem no direito penal incriminador, bem como a interpretação integrativa ou ampliativa.
Na obra “Violência doméstica e familiar contra a mulher”, o autor, ao se manifestar sobre o assunto, assim aduziu:
Ao sustentar que as relações enunciadas neste artigo independem de orientação sexual não quis o legislador afirmar que ‘as relações pessoais enunciadas nesse artigo independem do gênero dos envolvidos’, isto porque, orientação sexual é conceito diverso de gênero que só tem real interesse quando a orientação sexual da pessoa é diversa do seu gênero. Deste modo, sendo a intenção da lei a proteção da mulher, o legislador ressalvou tão-somente que tal proteção deve ser a mesma, ainda quando esta mulher tiver uma orientação masculinizada ou quando o agressor homem tiver uma orientação sexual feminina. Todavia, tratando de violência baseada no gênero, seria interpretação ampliativa, vedada em direito penal, a que pretendesse responsabilizar uma mulher por agredir outra, nos moldes dos artigos 5º e 7º da Lei 11.340/06, ainda que se provasse que ambas mantivessem relações homoafetivas entre si (PORTO, 2007, p. 36).
O articulista está a esposar o entendimento que a Lei nº 11.340/06, visa à proteção da mulher ainda que esta tenha uma orientação masculinizada, não abrangendo o homem que tenha orientação sexual feminina.
5 SUJEITOS ATIVO E PASSIVO
A lei trata desigualmente o homem e a mulher, incrementando a severidade penal sempre que uma mulher for vitima de violência doméstica ou familiar. O nosso legislador partiu da evidente constatação de que, em nossa sociedade, a mulher é reiteradamente oprimida pelo homem, razão pela qual em seus preceitos a lei procura eliminar ou erradicar esta discriminação, oferecendo os instrumentos nela contida, a começar pelo direito penal, com inegável repercussão na esfera administrativa, civil, trabalhista, como já se disse alhures, com o fito de transformar a realidade secular de violência de gênero.
Em uma análise açodada poder-se-ia dizer que em se tratando de violência de gênero só figuraria no pólo ativo o homem, o que constitui um raciocínio não condizente com a finalidade precípua da lei, sobretudo se feito o cotejo do que está ínsito no parágrafo único do art. 5º da lei sobejamente mencionada.
O que está definido de modo inconteste é que a lei visa proteger a mulher, portanto fixa um sujeito passivo próprio das formas de violência especificadas, é o que a depreende do texto legal, e da doutrina majoritária, como se vê:
Nesse sentido é o posicionamento inicial em analise preliminar da Lei nº. 11.340 in PORTO, Pedro Rui da Fontoura. Anotações preliminares à Lei nº. 11.340/06 e suas repercussões em face dos Juizados Especiais Criminais. (Jus Navigandi, acesso em: 14. fev. 2007. Publicado ainda em 14. fev. 2007. Publicado ainda nos sites do tj.rs.gov.br.institucional.estudos e mp.rs.gov.br.caocrim. Em geral todos os autores e comentaristas da lei que tivemos oportunidade de consultar e ouvir também não estão especializando o sujeito ativo dos crimes de violência doméstica, entendendo-o como podendo ser tanto o homem como a mulher.
5.1 CONCURSO DE PESSOAS
O crime pode ser praticado por uma ou várias pessoas em concurso, formando um vínculo psicológico entre eles, situação prevista no Código Penal Brasileiro em seu artigo 29, §§ 1º, 2º, conforme abaixo transcrito:
Art. 29. Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade.
§ 1º Se a participação for de menor importância, a pena pode ser diminuída de um sexto a um terço.
§ 2º Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave.
Ponto relevante a ser estudado é quanto ao concurso de pessoas nos crimes definidos pela Lei nº11.340/06. Inevitavelmente mister se faz distinguir o que é autoria, co-autoria e participação, uma vez que cada agente responderá na medida de sua culpabilidade, prevendo diminuição de pena na menor importância.
Autor, a definição é simples não exigindo muito esforço, e configura com a execução da ação prevista no tipo e o co-autor que é também participante, realiza com o autor a execução do delito e com ele está no local do evento. Participante, que pode ser o instigador ou o cúmplice, age por detrás do executor, instigando sua vontade ao crime ou auxiliando-o materialmente para aquele, e fica longe do lugar da infração.
A distinção acima foi de extrema importância, pois a indagação que se faz, vindo a constituir o busílis reside em saber se é admissível à co-autoria ou a participação nos crimes protegidos pela Lei nº 11.340/06.
Em magistral situação hipotética apresentada, as palavras de renomado doutrinador:
Assim, no caso da mulher que ajuda homem à agredir sua companheira, esposa ou namorada, obrando em situação de violência domestica, e tendo conhecimento das relações domesticas, familiares ou de convivência entre estes, também ela responde pelo delito do artigo 129, § 9º, do CP. Com as restrições do art. 41 da Lei 11.340/06 que proíbe os benefícios da Lei 9.099/95 em situações de violência doméstica contra a mulher. Caso contrario, se, por exemplo, ignorasse as relações especificas entre eles responderia apenas pelo delito do artigo 129, caput, do CP e ainda poderia beneficiar-se da Lei 9.099/95 em sua plenitude (PORTO, 2007, p. 34).
O autor do brilhante exemplo transcrito acima fez uma análise do que é autoria e co-autoria em conjunto com o art. 30 do CP, que dispõe: “Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime”.
Portanto, para que essas “circunstâncias” se comuniquem aos co-autores ou partícipes é necessário que sejam destes conhecidos. O desconhecimento da circunstância elementar pode elevar a condenação por delito menos grave ou à absolvição, conforme o caso.
Neste passo é importante registrar que a comunicabilidade das circunstâncias de caráter pessoal elementares, em regra, são incomunicáveis, mas, quando elementares do crime, isto é pertencente ao próprio tipo, comunicam-se aos participantes desde que delas tenham conhecimentos.
Assim podemos constatar que na prática do delito do art. 129, § 9º do CP, envolvendo relações de parentesco, convivência, coabitação doméstica e hospitalidade, configura elementares do tipo penal e, sendo do conhecimento do co-autor ou partícipe a ele se comunicam.
6 FORMAS DE LESÕES CORPORAIS LEVE
Para se chegar à conclusão do que é lesão corporal leve, o fazemos por exclusão, haja vista que nos §§ 1º, 2º, e 3º do art. 129 do CP estão previstos os resultados que tornam a lesão grave, gravíssima ou seguida de morte, de modo que, a lesão corporal leve é aquela que não causa quaisquer dos eventos mencionados nos §§ retrocitados e em seus respectivos incisos.
A Lei nº 11.340/06 manteve o texto integral do artigo 129 § 9º, modificado pela Lei nº 10.886/04, apenas ampliando a pena máxima para três anos e reduzindo a mínima para três meses, com isso excluindo do âmbito da Lei nº 9.099/95.
6.1 PRINCÍPIO DA INSIGNIFICANCIA
Quanto a aplicação deste princípio desenvolvido pelo eminente jurista alemão, Claus Roxin, na década de 60, na vigência do artigo 129, sem a alteração inserida pela lei que ora examinamos, era discutível a sua aplicação, pois em alguns julgados admitia-se e em outros já não se admitia, citando-se abaixo os divergentes posicionamentos jurisprudenciais:
TACRSP: ‘Em casos especialíssimos, é de se admitir que uma lesão, de tão mínima, não se mostre relevante para o Direito Penal, pois se mostraria absolutamente desproporcional o apenamento criminal em face de um ferimento, levíssimo, sequer visível em um primeiro momento’ (RT 713/363). TACRSP: ‘Se forem levíssimas as lesões corporais sofridas pela vitima, é de se aplicar a teoria da insignificância’ (JTACRIM 88/407).
TACRSP: ‘Em sede de crime de lesão corporal é inadmissível a aplicação do principio da insignificância, visto que, a integridade física do ser humano constitui bem superior que merece proteção especial da lei’ (RJDTACRIM 15/117). TACSP: ‘O simples fato de serem insignificantes as lesões não basta absolvição pelo delito do art. 129 do CP. Impõe-se a solução, porque o bem jurídico protegido é a incolumidade da pessoa na sua realidade corporal-anímica’ (JTACRIM 29/387) (MIRABETE, 2003, p. 864).
Hodiernamente, sendo inaplicável a Lei nº 9.099/95 no caso de violência doméstica e familiar, por maior razão, não há acolhimento ao princípio da insignificância, uma vez que como já dissemos a Lei nº 11.340/06 veio para coibir e erradicar a violência doméstica e familiar, rechaçando integralmente a violência de gênero feminino, obviamente tendo como destinatário desta proteção a mulher, que indubitavelmente no recesso do lar é a parte mais fraca, indefesa, é alvo fácil para ser agredida pela parte mais forte, o marido, companheiro, namorado etc.; portanto, contando com proteção especial, razão pela qual há óbice a aplicação do princípio já mencionado, ainda que por pretensa política criminal.
A Lei nº 11.340/06 não admite as medidas despenalizadoras da Lei nº 9.099/95, consequentemente também inadmissível à aplicação do princípio da insignificância, ainda que sobre pretensa aplicação de política criminal, restando ao agressor a suspensão condicional da pena.
7 INAPLICABILIDADE DA LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS
Indubitavelmente houvera influência dos movimentos feministas, no sentido de eliminação da possibilidade de aplicabilidade da Lei nº 9.099/95, pois atribuíam a banalização da violência doméstica e familiar aos institutos acolhidos pela lei retrocitada, inclusive imputavam as renúncias das vitimas ao comportamento do próprio magistrado.
Há pesquisa da insigne Carmem Hein Campos, integrante da Ong -Themis – Assessoria Jurídica e Estudos de Gênero de Porto Alegre revela a banalização da violência doméstica, sintetizando seus estudos, na forma que subsegue:
Tal banalidade é afirmada pelos números dessa violência nos Juizados: 70% dos casos julgados nos Juizados Especiais referem-se à violência conjugal e 90% deles terminam em conciliação com a renúncia da vitima à representação. É precisamente na conciliação que reside uns maiores problemas para as mulheres nos Juizados: a decisão terminativa do conflito é, na grande maioria das vezes, induzida pelos Juizes (...) Então, na pratica, o grande números de renúncias é originados pelo comportamento do próprio Magistrado. Tal postura fere o direito da vitima de ver aplicada a pena. A preocupação dos juizes parece ser a de diminuir o número de processos que é bastante elevado. Pouco importa se a vítima sai satisfeita com a solução dada ao caso. É por isso que nos juizados a conciliação com a renuncia do direito com a representação é a regra (CAMPOS, 2003, apud PORTO, 2007, p. 40).
É forçoso concluir que o Legislador ao inserir o artigo 41 na Lei nº 11.340/06, o fez em atendimento aos reclamos dos movimentos feministas de maneira que há expressa condenação do Juizado Especial Criminal, na medida em que o artigo 41 da Lei nº 11.340/06 determina a não aplicação da Lei nº 9.099/95.
A lei à qual foi proposta de estudo desta monografia incrementou o poder punitivo do Estado, diminuiu o status libertatis, excluiu benefícios despenalizadores (artigo 41), alterou penas (artigo 44), bem como estabeleceu normas majorante, inseriu agravante (artigo 43), e prisão preventiva (artigos 20 e 42).
O artigo 41 da Lei nº 11.340/06 está assim redigido: “Aos crimes praticados com violência domestica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei 9099 de 26 de setembro de 1995”.
A despeito do artigo 41 da Lei nº 11.340/06 afastar a possibilidade da aplicação da Lei nº 9.099/95, não se deve fazer uma leitura açodada desse artigo, sendo necessário espiolhar e ler de modo acurado, para se concluir que é aplicável a Lei nº 9.099 nos caso de contravenções penais, sendo as mais comuns (vias de fato artigo 21, perturbação do trabalho ou sossego alheio artigo 42, importunação ofensiva ao pudor artigo 61 e perturbação da tranqüilidade artigo 65). Deste modo, vê-se que a Lei nº 9.099/95 continua sendo aplicável no tocante as contravenções penais, afastando-se a possibilidade somente no atinente aos crimes. E ainda é importante não se olvidar que a analise que hora se faz deve estar em consonância com o artigo 17 da lei sob estudo, que veda penas de sexta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa.
7.1 APLICAÇÃO DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA
Para definirmos se é cabível o sursis nos delitos previstos na Lei nº 11.340/2006, inicialmente é importante entender quando é cabível a suspensão condicional da pena, instituto também conhecido por sursis.
Malgrado constar a expressão “poderá” no artigo 77 da lei substantiva penal, trata-se de um direito penal público subjetivo do condenado, obviamente desde que presente seus requisitos. Se não concedido pelo juiz pode ser obtido por intermédio de habeas corpus.
7.2 OS SISTEMAS DO SURSIS
1º) Sistema anglo-americano (probation system): neste sistema verificando o juiz que o réu merece o benefício, declara-o responsável pela prática do fato, suspende o curso da ação penal e marca o período de prova, ficando o beneficiário sob orientação e fiscalização de funcionários (probation officeres), com incumbência de realizar seu reajustamento social. Há suspensão da sentença condenatória, que não é proferida.
2º) Sistema belga-francês (europeu continental – consoante este sistema o juiz condena o réu, determinando a suspensão condicional da execução da pena privativa de liberdade. É o nosso sistema.
7.3 REQUISITOS DA SUSPENSÃO DA PENA
O Código Penal Brasileiro estabelece os requisitos para que não se execute a pena privativa de liberdade ao condenado, e o faz em seu artigo 77, I, II, III, que se preenchidos, acarreta a suspensão condicional da pena, e nesse passo se faz necessário transcrevê-lo, conforme subsegue:
Art. 77. A execução da pena privativa de liberdade, não superior a dois anos, poderá ser suspensa, por dois a quatro anos, desde que:
I – o condenado não seja reincidente em crime doloso;
II – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício;
III – não seja indicada ou cabível a substituição prevista no artigo 44 deste Código.
Ao que parece a Lei nº 11.340/2006 ressuscitou o sursis, na medida em que em seu artigo 41 inadmitiu a aplicação da Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995 .
Em sendo o crime do artigo 129 § 9º do CP apenado com três meses a três anos de detenção, deixou de ser delito de menor potencial ofensivo e conforme os artigos 17 e 41 da Lei nº 11.340/2006, não há como aplicar-se as medidas despenalizadoras da transação penal ou da suspensão condicional do processo.
Dessume-se do que acima foi exposto, que a única fórmula para evitar a prisão no caso do crime do art. 129 § 9º e os demais delitos quando praticados em situação de violência doméstica e familiar, será a suspensão condicional da pena com base no artigo 77 do Código Penal.
8 O ARTIGO 129 § 9º, DO CP. OS CRIMES PRATICADOS CONTRA A MULHER – NATUREZA DA AÇÃO
In casu, para melhor compreensão do estudo desenvolvido e explanação do contido na presente monografia e explicitação quanto a natureza da ação no crime tipificado no artigo 129 § 9º do CP, quando praticado contra a mulher, é importante fazer, ainda que de forma perfunctória, um conceito de ação penal e classificação subjetiva das ações.
8.1 AÇÃO PENAL
Conceito: O Estado é o detentor do direito de punir, pois os bens ou interesses tutelados pelas leis penais são eminentemente públicos, sociais, de maneira que, a aplicação da sanção legal ao infrator da norma penal, jamais poderia ficar ao talante do particular.
O modo de garantir a observância da lei é através do Estado – Administração - investigando o fato, quem foi o seu autor, e o faz através de órgãos próprios – Polícia Judiciária - que em procedimento persecutório administrativo leva as informações necessárias para outro órgão – Ministério Público - que ao formular a denúncia provoca a ação do juiz, e restando comprovada a responsabilidade do infrator aplicará a sanção legal.
Esse direito que tem o Estado de levar ao conhecimento do juiz que em tese constitui crime, delimitando a autoria e concomitantemente pleiteando a aplicação do direito penal objetivo, é o que chamamos direito de ação penal.
8.2 CLASSIFICAÇÃO SUBJETIVA DA AÇÃO PENAL
Dispõe o artigo 100 do Código Penal:
Art. 100. A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido.
.§ 1º A ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei o exige, de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça.
§ 2º A ação de iniciativa privada é promovida mediante queixa do ofendido ou de quem tenha qualidade para representá-lo.
§ 3º A ação de iniciativa privada pode intentar-se nos crimes de ação pública, se o Ministério Público não oferece denúncia no prazo legal.
§ 4º No caso de morte do ofendido ou de ter sido declarado ausente por decisão judicial, o direito de oferecer queixa ou de prosseguir na ação passa ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.
Preceitua o artigo 24 do Código de Processo Penal:
Art. 24. Nos crimes de ação pública, esta será promovida por denúncia do Ministério Público, mas dependerá, quando a lei o exigir,de requisição do Ministro da Justiça, ou de representação do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo.
§ 1º No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o direito de representação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.
§ 2º Seja qual for o crime, quando praticado em detrimento do patrimônio ou interesse da União, Estado e Município, a ação penal será pública.
Preconiza o artigo 30 do Código de Processo Penal: “Ao ofendido ou a quem tenha qualidade para representá-lo caberá intentar a ação privada”.
As ações penais se classificam em públicas ou privadas. Interessa-nos no momento o estudo da ação pública, esta promovida pelo Ministério Público, sendo regra no nosso direito. A ação publica pode ser condicionada ou incondicionada.
Diz-se incondicionada quando o seu exercício não depender de manifestação de vontade de quem quer que seja. Condicionada, quando a propositura da ação penal depender de uma manifestação de vontade. Esta manifestação de vontade se cristaliza num ato que se chama de representação ou requisição do Ministro da Justiça.
Dito isto, a discussão quiçá das mais importantes, se refere à ação penal, nos casos em que a lesão corporal é de natureza leve - artigo 129 § 9º do CP, e praticado contra a mulher nas relações doméstica e familiar, se permanece ou não a exigibilidade da representação.
8.3 AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA OU PÚBLICA CONDICIONADA À REPRESENTAÇÃO?
Trata-se de ponto controvertido e somente com o tempo a doutrina e a jurisprudência, firmará posicionamento acerca da ação penal na lesão de natureza leves nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher.
Sabe-se que há duas posições doutrinárias, figurando como defensores juristas dos escóis de Damásio Evangelista de Jesus e Luiz Flavio Gomes, cujos entendimentos invocamos:
Segundo Damásio de Jesus (2006),
O artigo 129 do Código Penal, que descreve o crime de lesão corporal, alterado pela Lei nº. 11.340, de 7 de agosto de 2006, a denominada “ Lei Maria da Penha, ganhou a seguinte redação em seu § 9º :
Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, com quem conviva ou tenha convivido ou, ainda prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade:
Penal – detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos.
A forma qualificada, embora aplicável também ao homem, visou principalmente dar maior proteção aplicável também ao homem, visou principalmente dar maior proteção à mulher que se vê agredida no âmbito doméstico e familiar.
Nos termos do artigo 16 da mesma lei, Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denuncia e ouvido o Ministério Público,
Por sua vez, o artigo 41 do novo estatuto determina que ‘Aos crimes praticados com violência doméstica ou familiar contra a mulher, independente da pena prevista, não se aplica a Lei nº. 9.099, de 26 de setembro de 1995’ (Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais),
Diante das duas disposições, de indagar-se: a ação penal por crime de lesão corporal resultante de violência domestica ou familiar contra a mulher é pública incondicionada ou pública condicionada representação?
Haverá duas posições:
1ª – a ação penal por crime de lesão contra a mulher, resultante de violência domestica ou familiar, pública incondicionada, tendo em vista que o artigo 41 da Lei 11.340/06 excluiu, nesse caso, a aplicação da Lei nº. 9.099/95, em que se inclui o artigo 88 que previa a representação como condição de procedibilidade.
2ª. – trata-se de ação penal pública condicionada á representação (nossa posição).
Segundo entendemos, a Lei nº 11.340/06 não pretendeu transformar em publica incondicionada a ação penal por crime de lesão corporal cometido contra mulher no âmbito doméstico e familiar, o que contraria a tendência brasileira da admissão de um Direito Penal de Intervenção Mínima e dela retiraria meios de restaurar a paz no lar.
Público e incondicionado o procedimento policial e o processo criminal, seu prosseguimento, no caso de a ofendida desejar extinguir os males de certas situações familiares, só viria piorar o ambiente domestico, impedindo reconciliações.
O propósito da lei foi o de excluir da legislação a permissão para aplicação de penas alternativas, consideradas inadequadas à hipótese, como a multa e a prestação pecuniária, geralmente consistente em cestas básicas (art.17). O referido artigo 88 da Lei nº. 9.099/95 não foi revogado, nem derrogado. Caso contrário, a ação penal por vias de fato e lesão corporal comum seria também pública incondicionada, o que consistiria em retrocesso legislativo inaceitável.
Além disso, de ver-se o artigo 16 da Lei 11.340/06: não teria sentido falar em renúncia à representação se a ação penal fosse pública incondicionada.
A lei brasileira enfrentou o mesmo dilema no qual se viram envolvidas outras legislações: o do empowerment das mulheres. O início da persecução criminal e seu prosseguimento devem ser deixados nas mãos das mulheres ou o poder de decisão pertence somente ao Estado, sem a interferência daquelas? Aceita a primeira alternativa, sendo a ação penal de exclusiva iniciativa da vitima, sem interferência do Estado (ação penal privada), sua decisão de processar ou não o autor da violência e de prosseguir ou não com a persecução criminal pode derivar de inúmeros motivos e situações: reconciliação, vingança, medo, pressão, susto no agressor, trauma etc. sob outro aspecto, sabemos que, nas ações penais privadas, poucos são os casos de condenação. Além disso, deixar o poder de iniciativa só com a vítima enfraqueceria a política publica de minimizar esse mal social. Adotada a segunda opção, tornando a ação penal pública incondicionada, o episódio pode resultar em condenação do autor, o que, tratando-se de marido, ensejaria até a ruína da família.
Entre os dois caminhos, a lei brasileira escolheu o meio termo, desprezando as duas variantes – nem ao céu, nem a terra. Decidiu-se por uma posição intermediária, em que a ação penal não é exclusivamente privada, nem pública incondicionada. Daí ter acolhido a opção da ação penal dependente da representação. Como consta do guide for Law Enforcement Officiais on ‘Effective Responses to Violence against Women’ ‘a autodeterminação das mulheres deve ser um dos princípios que norteiam a atividade policial e a da justice Criminal’ (Consulex, Brasília, ano X, n. 237, 30 nov. 2006).
Já para Luiz Flavio Gomes (2006),
Nos termos do artigo 16 da Lei nº. 11.340/06, ‘nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público’.
O citado artigo, de modo incompreensível, diz que a audiência (designada para que a vitima manifeste sua renúncia) deve ser realizada antes do recebimento da denuncia (sic), Nesse ponto, salve melhor juízo, o legislador escreveu palavras inúteis. Se a renuncia só pode ocorrer antes do oferecimento da representação e se o MP antes dessa manifestação de vontade da vitima (condição especifica de procedibilidade) não pode oferecer denuncia, parece evidente que a lei não poderia ter feito qualquer menção ao recebimento da denuncia.
Considerando-se o disposto no artigo 41 da nova lei, que determinou que aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a lei nº. 9.099/95 já não se pode falar em representação quando a lesão corporal culposa ou dolosa simples atinge a mulher que se encontra na situação de Lei 11.340/06 (ou seja, numa ambiência doméstica, familiar ou intima).
Nesses crimes, portanto, cometidos pelo marido contra a mulher, pelo filho contra a mãe, pelo empregador contra a empregada doméstica, não se pode mais falar em representação, isto é a ação penal transformou-se em público incondicionada (o que conduz a instauração de inquérito policial).
Não existe nenhuma incompatibilidade, entre o artigo 41 e o artigo 16. O primeiro excluiu a representação no delito de lesão corporal culposa e lesão simples. No segundo, existe expressa referência a representação de mulher - vitima. Mas é evidente que esse ato só tem pertinência em relação a outros crimes (ameaça, crimes contra honra da mulher, contra sua liberdade sexual quando ela for pobre, etc.), aliás, nesses outros crimes, a autoridade policial vai colher a representação da mulher (quando ela desejar manifestar sua vontade) logo no limiar do Inquérito policial ( art.12, I da Lei nº. 11.340/06) (Consulex, Brasília, ano X, n. 233, 30 set. 2006).
A novel lei ainda será objeto de ampla discussão, pois os posicionamentos doutrinários supra-expendidos, sobretudo se os delitos de lesão leves quando cometidos em situações de violência doméstica e familiar estão ou não sujeito a representação, ainda não se firmaram, bem como o entendimento jurisprudencial quanto a natureza da ação, isso até a conclusão do presente trabalho.
9 ASPECTOS CONSTITUCIONAIS DA LEI Nº 11.340/2006
Este tópico já foi de certa forma tangenciado, na medida em que se tratou do princípio da isonomia insculpido no artigo no artigo 5º, I da Magna Carta:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;
O constituinte, ao igualar homens e mulheres acatou rigorosamente uma solicitação há muito reclamada. Expressando em termos constitucionais as longas lutas travadas contra discriminação do sexo feminino. E ao fazê-lo garantiu mais do que a igualdade perante a lei. Assegurou a igualdade real, material. Logo, vê, homens e mulheres que estiverem em situação idêntica, não poderão, seja qual for o argumento, sofrer qualquer cerceamento em suas prerrogativas e nos seus deveres, sob pena de infringir a manifestação constituinte originária.
Os que argúem inconstitucionalidade invocam o artigo supra e fazem inúmeras indagações, apontam alguns artigos que carregam essa eiva, e normalmente citam como exemplo o delito de lesões leve que no mesmo contexto familiar – doméstico, conforme as circunstâncias e o sexo do agressor, entendem haverá tratamento diferenciado, uma vez que a famigerada lei impõe ao agressor se homem a prisão em flagrante delito ou inquérito policial por portaria, sem possibilidade de se beneficiar dos institutos despenalizadores da Lei nº 9.099/95, ao passo que em situação inversa, ou seja o homem figurando na condição de sujeito passivo no ilícito penal e com lesão na mesma proporção, sendo a agressora a mulher, a esta não se impõe a prisão em flagrante delito e sim lavratura de termo circunstanciados portanto menos gravoso.
Ponto discutível é quanto aos crimes patrimoniais e as imunidades penais dos artigos 181 e 182 do CP, em face do disposto do artigo 7º, inciso IV da Lei nº 11.340/2006. Para uma melhor compreensão do estudo que se realizará é necessário, a transcrição dos artigos referidos:
Art. 181. É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste título, em prejuízo:
I – do cônjuge, na constância da sociedade conjugal;
II – de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou natural.
Art. 182. Somente se procede mediante representação, se o crime previsto neste título é cometido em prejuízo:
I – do cônjuge desquitado ou judicialmente separado;
II – de irmão, legítimo ou ilegítimo;
III – de tio ou sobrinho, com quem o agente coabita.
Os artigos supra transcritos abarcam a imunidade absoluta e a imunidade relativa sendo objeto de interesse desta exposição. O conceito da primeira é caracterizado pela isenção de pena, de modo que não pode ser instaurado inquérito policial e muito menos ação penal contra o beneficiário, por falta de interesse de agir, vez que não é possível a imposição de pena. Embora antijurídico e culpável, inaplicável a sanção penal. E a segunda prevista no artigo 182 do CP, por razão de política criminal exigiu como condição de procedibilidade a representação para instauração para ação penal pública.
A jurisprudência pátria, quando da existência dos tribunais de alçada, em observância aos artigos já mencionados, sempre acolheu as imunidades, vejamos:
Inadimissibilidade de instauração de inquérito policial –TACRSP: ‘Nos termos do art. 181 do CP, é isento de pena, por imunidade absoluta e obrigatória, quem comete qualquer um dos crimes contra o patrimônio, previstos no titulo II do citado Codex, em prejuízo do cônjuge, na constancia da sociedade conjugal, o que, por si só, impede a instauração de inquérito policial ou mesmo de ação penal, por falta de interesse de agir’ ( RT 764/574).
Crime cometido após a separação judicial – TACRSP: ‘Tendo o furto contra cônjuge ocorrido depois de decretada judicialmente a separação de corpos não cabe a aplicação da norma do art.181, I, do CP, regendo-se a hipótese pelo art. 182, I, do mesmo diploma’ (RT. 528/357).
Viu-se que a lei, doutrina e a jurisprudência sempre tiveram como base, a isenção dos crimes patrimoniais envolvendo cônjuges, desde que não haja emprego de grave ameaça ou violência à pessoa. Nos casos de imunidade absoluta ocorre a isenção de pena e nos casos de imunidade relativa, como condição de procedibilidade exige-se a representação, doravante com a Lei nº 11.340/06 surgem controvérsias quanto aos crimes patrimoniais e as causas de imunidades penais.
Na obra “Violência doméstica e familiar contra a mulher”, o autor trouxe à baila a discussão acerca do assunto, quando assim consignou:
Sendo, pois, propósito da lei alcançar, sob o conceito da violência doméstica, os crimes patrimoniais não-violentos como o furto, especialmente o furto de coisa comum a usurpação, o dano, apropriação indébita e o estelionato, calha questionar se a Lei 11.340/06 revogou as causas de imunidade penal previstas nos incisos I e II do art. 181 do CP, das quais deriva isenção de pena ao agente que comete qualquer delito patrimonial, sem violência real ou grave ameaça, contra o cônjuge na vigência da sociedade conjugal, ascendente ou descendente, seja o parentesco legitimo ou ilegítimo, civil ou natural em hipóteses subsumíveis nos arts. 5º e 7º, IV, da Lei 11.340/06.
Guilherme de Souza Nucci, comentando o inciso IV do art. 7º da Lei Maria da Penha, referente às hipóteses de violência patrimonial, asseverou não ver grande utilidade de sua previsão no contexto penal,pois “ lembremos que há as imunidades (absoluta ou relativa),fixadas pelos arts.181 e 182 do Código Penal, nos casos de delitos patrimoniais não violentos no âmbito familiar”. Ou seja, para este autor, as imunidades referidas não foram revogadas (In Leis Penais e Processuais Penais Comentadas, São Paulo:Revista dos Tribunais, 2006,867). A nosso ver, entretanto,ocorre a derrogação (revogação parcial) de tais dispositivos, porquanto esta se dá não apenas na forma expressa, mas também na modalidade tácita, de sorte que, quando a Lei Maria da Penha enfatiza tão acentuadamente o caráter criminoso da violência patrimonial contra a mulher, conceituando as formas existencializadoras desta modalidade de violência, deixou implícito que qualquer regra anterior que imunizasse penalmente o autor de delitos abrangidos no conceito ali sedimentado estava revogada (PORTO, 2007, p. 61).
A desembargadora Maria Berenice Dias comunga com entendimento de Porto, no tocante a não aplicabilidade das imunidades absoluta ou relativa dos artigos 181 e 182 do Código Penal, sobretudo quando assim asseverou:
A partir da vigência da Lei Maria da Penha, o varão que ‘subtrair’ objetos da sua mulher pratica violência patrimonial (art. 7º., IV). Diante da nova definição de violência doméstica, que compreende a violência patrimonial, quando a vítima é mulher e mantém com o autor da infração vínculo de natureza familiar, não se aplicam as imunidades absoluta ou relativa dos arts. 181 e 182 do Código Penal. Não mais chancelando o furto nas relações afetivas, cabe o processo e a condenação, sujeitando-se o réu ao agravamento da pena (CP, art. 61, II, f) (DIAS, apud CABETTE, 2007).
Ab initio, em análise puramente literal da nova lei, parece fora de dúvida que a resposta afirmativa se impõe, e as imunidades ou impunibilidades absolutas do art.181, I e II do CP estão revogadas parcial e tacitamente pela Lei nº 11.340/06, que alenta a punição dos crimes praticados em situação de violência patrimonial contra o cônjuge mulher. Frise-se que se trata mesmo de derrogação,ou seja, revogação parcial, porque se o delito for praticado pela mulher contra o homem acredita-se que persiste a escusa absolutória em questão.
Porém, o tratamento desigual dado pela lei aos dois gêneros, ao menos nesse ponto, arranha o principio constitucional da igualdade, especialmente, porque se afigura destituído de razões lógicas ou racionais. Se, com efeito, no tangente à violência real, a compleição física do homem, normalmente mais avantajada, bem como suas características hormonais o capacitam mais ao uso da força bruta, no que toca à possível prática de delitos patrimoniais contra o consorte condômino, não se vislumbra, com clareza, quais as vantagens que concorrem em favor do cônjuge-varão que justifique tratamento tão desigual.
Assim é que não causa surpresa se, no futuro, for reconhecida a inconstitucionalidade parcial do dispositivo em questão por afronta ao principio da igualdade, pois a proteção da igualdade não significa necessariamente a equalização linear e absoluta dos interesses e das prerrogativas legais, uma vez que, ao contrario na persecução de uma maior igualdade material, admite-se tratamentos legais diferenciados, é imprescindível que esta diferenciação formal-legal tenha supedâneo em motivação racional.
Em julgamento recente pela 2ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, deu-se início ao julgamento, em 21/09/2007, em que se discute a constitucionalidade da “Lei Maria da Penha” ora transcrito:
A última sessão de julgamento da 2ª Turma Criminal, composta pelos desembargadores claudionor Abss Duarte, Romero Osme lopes e Carlos Eduardo Contar, sob a presidência do primeiro, trouxe ao Tribunal de justiça do Estado uma polêmica discussão que tem movimentado o cenário jurídico do pais, notadamente no âmbito penal.
Na ocasião, foi apreciado um recurso (Recurso em Sentido Estrito) referente ao processo nº 2007.023422-4, em que o Ministério Público recorre da decisão do juiz da Vara Única de Itaporã (MS), o qual considerou Inconstitucional a Lei nº 11.340, de 07/08/2006, conhecida por ‘Lei Maria da Penha’, criada com o intuito de coibir e previnir a violência doméstica e familiar contra a mulher.
O relator do processo, Des. Romero Osme Lopes, em seu voto, teceu suas considerações acerca da referida norma jurídica mantendo a decisão de primeira instancia e negando provimento ao recurso do Ministério Publico, por também considerar a ‘Lei Maria da Penha’ Inconstitucional, uma vez que fere princípios basilares da Carta Magna, como a isonomia e a proporcionalidade.
Antes a complexidade e a polêmica da matéria, o Des.Contar pediu vistas do processo para analisá-lo mais detidamente, tendo em vista a repercussão que os efeitos dessa decisão alcançará. O Des. Claudionor preferiu aguardar para se manifestar, de modo que o processo está adiado, em principio, até a próxima sessão de julgamento.
Controle de Constitucionalidade – No Brasil, vige a presunção de constitucionalidade das normas infraconstitucionais, isto é, todas as leis, em sentido amplo, são consideradas constitucionais até que se prove o contrario. Há, no entanto, um controle exercido por órgão dos três Poderes constituídos, de modo a garantir a regularidade no processo de elaboração das normas jurídicas brasileiras.
Tanto o Legislativo, quanto o Executivo exercem tal controle previamente, por meio de suas Comissões de Constituição e Justiça (CCJ) ou força do veto do chefe do poder (presidente, governador ou prefeito). Entretanto, ambos os modos descritos são superáveis, isto é, não impedem que a norma em elaboração seja publicada e produza efeitos.
Assim sendo, consagrou-se no país o sistema de controle jurisdicional, exercido pelo judiciário, por ser o único capaz de retirar a eficácia de um dispositivo legal considerado inconstitucional.Esse controle exercido pela justiça, por sua vez, pode ocorrer de modo difuso ou concentrado.
Na primeira hipótese, qualquer órgão jurisdicional (magistrado ou tribunal) pode declarar a inconstitucionalidade de uma norma jurídica ao apreciar um caso concreto, como ocorreu em Itaporã. Já de outro modo, ao Supremo tribunal Federal (STF) compete julgar se alguma espécie normativa é ou não constitucional. Neste caso, não há um caso especifico, analisa-se a lei em tese, em abstrato.
Cabe ressaltar que a decisão do magistrado de Itaporã, caso seja mantida pela 2ª Turma Criminal do TJ, vai retirar a eficácia da ‘Lei Maria da Penha’ apenas nesse caso especifico, entre as partes envolvidas no litígio. Para que a referida lei perca eficácia em âmbito nacional, há que ser suscitada sua inconstitucionalidade junto ao STF.
Outro ponto controvertido é quanto a identificação criminal, mormente quando a Lei nº 11.340/06 em seu art.12, VI, assim preceitua:
Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal:
VI - ordenar a identificação do agressor e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes criminais, indicando a existência de mandado de prisão ou registro de outras ocorrências policiais contra ele:
A questão de alta indagação é saber se foi criada uma nova hipótese de identificação obrigatória, dentre aquelas previstas na Lei nº 10.054/2000, onde elencou-se os caso de identificação vejamos:
Art. 3º O civilmente identificado por documento original não será submetido à identificação criminal, exceto quando:
I – estiver indiciado ou acusado pela prática de homicídio doloso, crimes contra o patrimônio praticados mediante violência ou grave ameaça, crime de receptação qualificada, crimes contra a liberdade sexual ou crime de falsificação de documento público;
II – houver fundada suspeita de falsificação ou adulteração do documento de identidade;
III – o estado de conservação ou a distância temporal da expedição de documento apresentado impossibilite a completa identificação dos caracteres essenciais;
IV – constar de registros policiais o uso de outros nomes ou diferentes qualificações;
V – houver registro de extravio do documento de identidade;
VI – o indiciado ou acusado não comprovar, em quarenta e oito horas, sua identificação civil.
Portanto o que se questiona é que se o fato de ter perpetrado um crime previsto na lei em análise, seria mais um caso de identificação obrigatória, deixando de ser taxativo o rol das possibilidades de identificação inseridos na lei de identificação, conforme explicitado no artigo 3º e incisos.
O certo é que a redação do artigo 12, VI da Lei nº 11.340/2006, poderá dar ensanchas à interpretação quanto a uma nova situação de identificação criminal.
A questão da constitucionalidade da Lei nº 11.340/06, constitui exemplo de ação afirmativa no sentido de buscar maior e melhor proteção a um segmento da população que vem sendo diariamente vitimizado (no caso, mulher que se encontra no âmbito de uma relação doméstica, familiar ou íntima). O art. 5º, I da CF diz que “Homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”, mas o tratamento diferenciado em favor da mulher tal como o que lhe foi conferido agora com a Lei nº 11.340/06 justifica-se, não é desarrazoado visto que a violência doméstica tem como vítima, em regra, a mulher.
Quando se trata de diferenciação justificada, por força do critério valorativo, não há que falar em violação ao princípio da igualdade, ou seja, em discriminação, e sim, em ação afirmativa que visa a favorecer e conferir equilíbrio existencial, social, econômico, educacional, etc. a determinado grupo. Segundo entendimento de uma parte dos doutrinadores, João Paulo de Aguiar Sampaio Souza e Tiago Abud da Fonseca, somente com o tempo e na medida em que a lei for apreciada quer no controle difuso ou no controle concentrado é que saberá se há inconstitucionalidade de alguns artigos da lei ora examinada.
10 POSSIBILIDADE DE PRISÃO PREVENTIVA
A prisão preventiva sempre foi utilizada desde os tempos dos romanos, como medida cautelar, para garantir o cumprimento da lei penal. O indivíduo acusado de ter cometido um crime ficava encarcerado, aguardando o julgamento. Isto evitava que fugisse e permanecesse impune (FEU ROSA, 2007)
Os antigos não adotavam a prisão celular como pena. O réu permanecia nas masmorras até ser condenado ou absolvido. Se condenado, era à pena de morte, às galés, trabalhos forçados, degredo etc. (FEU ROSA, 2007)
Prisão preventiva trata-se de uma medida cautelar de constrição a liberdade do indiciado ou réu, de maneira que há de ser respeitados os requisitos estabelecidos em lei e computam-se, na pena privativa de liberdade e na medida de segurança, sendo portanto obrigatório o seu desconto da pena aplicada, conforme dispõe o artigo 42 do CP.
De acordo com o artigo 312 do Código de Processo Penal, a prisão preventiva deve ser decretada apenas quando haja indícios suficientes de que o acusado é autor do crime. Indício suficiente indica que deve haver um grande grau de certeza do acusado ser responsabilizado pelo crime.
Por isso, a expressão relaciona-se exclusivamente com questão de fato: o juiz deve basear-se em fatos específicos. São fatores que devem e precisam ser avaliados: o crime e a pena esperada (principio da proporcionalidade): relações familiares e sociais do acusado: estabilidade no emprego; residência fixa; condições de saúde.
Como diz Carnelutti, “Os interesses da justiça devem ter-se presente com equilíbrio não só aos fins de não deixar escapar um culpado mas, também, de não fazer sofrer um inocente” (apud FEU ROSA, 2007).
Por isso, o código coloca dentre os requisitos da custódia cautelar a prova da existência do crime e indício suficiente de sua autoria. O fato deve apresentar desenganadamente, aspectos de antijuridicidade, tipicidade e culpabilidade, que constituem a essência do crime.
Indispensável a explanação acerca da prisão preventiva, para que se entre no ponto crucial sobre a prisão preventiva, uma vez que a lei sob estudo faz previsão quanto ao cabimento da medida cautelar, quando em seu artigo 20 e parágrafo único assim preconiza:
Art. 20. Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal caberá a prisão preventiva do agressor, decretada pelo juiz, de oficio, a requerimento do Ministério Publico ou mediante representação da autoridade policial.
Parágrafo único. O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no curso do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.
O art. 42, da Lei nº 11.340/2006, além das hipóteses contidas no art. 313 do CPP, acrescentou mais um requisito para a prisão preventiva no inciso IV que diz: “se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, no termo da lei especifica para garantir a execução das medidas protetivas de urgência”. No entendimento de Luis Paulo Sirvinskas - 4º promotor de justiça criminal da Penha de França – São Paulo, tal inciso deveria ter sido inserido no artigo 312, como mais uma hipótese para prisão preventiva e não no artigo 313, que trata das hipóteses de prisão.
A referida hipótese ampliou o rol de medidas elencadas no código de processo penal, o qual admitia a prisão somente nos crimes punidos com reclusão, e os punidos com detenção quando apurar-se que o indiciado é vadio ou, havendo dúvidas sobre a sua identidade, não fornecesse ou não indicasse elementos para esclarecê-las e se o réu tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado (art. 313, I, II, III).
A medida extrema será decretada para garantir a execução de uma ou de várias medidas de urgência descrita na lei, podendo ainda ser revogada no curso do processo, se não mais persistirem as causas que levaram à prisão do agressor, ou decretá-la novamente se sobrevierem razões que a justifiquem.
A natureza desta prisão já vem sendo amplamente discutida, alguns entendendo que se trata de prisão de natureza civil e não penal, e que poderia estar infringindo principio constitucional esculpido no art. 5º, LXVII, que autoriza a prisão civil apenas para as hipóteses de dívidas de alimentos ou depositário infiel. Tais hipóteses, como é cediço, compõem um rol taxativo que, por importarem em restrição da liberdade, não admitem ampliação. De forma que, ao se imaginar possível a decretação da prisão preventiva para assegurar o cumprimento de uma medida de urgência de índole civil, se estaria criando uma nova hipótese de prisão civil, por iniciativa que é vedada ao legislador infraconstitucional.
Há um exemplo magistral citado na obra “Violência doméstica”, abaixo transcrito:
Tomemos o exemplo de Eduardo Luiz Santos Cabette, ao sugerir a decretação da prisão preventiva contra àquele que não respeitar o limite de aproximação da vitima fixado pelo juiz. Caso esse desrespeito venha acompanhado da prática de algum crime (por exemplo, tentativa de homicídio, incêndio, ameaça etc.), ainda se pode cogitar da decretação da preventiva. Agora, quando analisado individualmente, isto é, quando seja apenas essa a conduta imputada ao agente, parece que a medida de exceção indevida, sob pena de configurar verdadeira inconstitucionalidade (CUNHA; PINTO, 2007, p. 82).
Como restou demonstrado, nos casos em que a prisão preventiva for decretada contra àquele que não respeitar o limite de aproximação da vítima, discute-se a natureza desta prisão, pois, se aplicada com motivação isolada, estaria ferindo o art. 5º, LXVII da Constituição Federal, que admite prisão civil somente para as hipóteses de dívida de alimentos ou depositário infiel. Na citação supra, entende-se cabível a prisão preventiva desde que o desrespeito venha acompanhado da prática de algum crime.
11 APLICAÇÃO INSTITUTO DA FIANÇA NA LEI Nº 11.340/2006
Inicia-se o presente capítulo trazendo o conceito da fiança criminal, abaixo transcrito:
Consiste em garantir por caução real que presta o acusado, ou alguém por ele, perante a autoridade policial ou judiciária a fim de poder defender-se em liberdade, nos casos em que a lei permite, comprometendo-se a estar em juízo e presentes em todos os atos do processo (NUNES, 1965, p. 453).
Como se vê a fiança tem natureza de caução real, e consiste em depósito de dinheiro pedras, objetos ou metais preciosos, títulos da dívida pública, federal, estadual ou municipal, ou em hipoteca inscrita em primeiro lugar.
É direito público subjetivo constitucional, conforme art. 5º LXVI da nossa Carta Política:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
LXVI – ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança;
Em sendo um desdobramento do princípio da presunção de inocência, o que possibilita a liberdade provisória do indiciado ou réu, durante o processo, obviamente preenchidas determinadas condições, de maneira que, não concedida a fiança quando cabível constitui abuso de autoridade nos termos do artigo 4º, alínea “e” da Lei nº 4.898, de 9 de dezembro de 1965.
Art. 4º Constitui também abuso de autoridade:
[...]
e) levar à prisão e nela deter quem quer que se proponha a prestar fiança, permitida em lei.
Após um breve estudo da fiança, mostrar-se-à sua aplicabilidade na lei sob comento, que a despeito de dar tratamento rigoroso nos casos de violência de gênero, no tocante ao apenamento manteve a punição com detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos para lesão corporal de natureza leve art.129 § 9º, com a alteração introduzida pelo art. 44, portanto afiançável, podendo in casu ser fixada pela autoridade policial, é o que se depreende do art. 322 do CPP, que observará o art. 325 e 326 do código mencionado, e nos demais casos em que a infração for punida com detenção ou prisão simples, sendo responsável pela concessão da fiança a autoridade que presidiu o auto de prisão em flagrante.
12 AÇÃO POLICIAL EM FACE DA NOVA LEI
Indubitavelmente o legislador ampliou e valorizou a atividade da autoridade policial, sobretudo quando nos artigos 10, 11 e 12 da lei sob exame estabeleceu uma série de medidas a cargo da autoridade policial para prevenção cautelar da integridade física, moral e patrimonial da vítima.
Dispõe o art.11 da Lei nº 11.340/06:
Art. 11. No atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, a autoridade policial deverá, entre outras providências:
I - garantir proteção policial, quando necessário, comunicando de imediato ao Ministério Público e ao Poder Judiciário;
II - encaminhar a ofendida ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto Médico Legal;
III - fornecer transporte para a ofendida e seus dependentes para abrigo ou local seguro, quando houver risco de vida;
IV - se necessário, acompanhar a ofendida para assegurar a retirada de seus pertences do local da ocorrência ou do domicílio familiar;
V - informar à ofendida os direitos a ela conferidos nesta Lei e os serviços disponíveis.
Pode acontecer que a vítima não tenha interesse imediato em representar, mas faça a opção em beneficiar-se de algumas providências elencadas no artigo supracitado, uma vez que são providências anteriores aos procedimentos do art.12, cuja representação poderá ser exercida no prazo decadencial, ou seja, no semestre legal.
A imensurável inovação que a lei traz vem no art.12, a seguir transcrito:
Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal:
I - ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a termo, se apresentada;
II - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e de suas circunstâncias;
III - remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao juiz com o pedido da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência;
IV - determinar que se proceda ao exame de corpo de delito da ofendida e requisitar outros exames periciais necessários;
V - ouvir o agressor e as testemunhas;
VI - ordenar a identificação do agressor e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes criminais, indicando a existência de mandado de prisão ou registro de outras ocorrências policiais contra ele;
VII - remeter, no prazo legal, os autos do inquérito policial ao juiz e ao Ministério Público.
§ 1o O pedido da ofendida será tomado a termo pela autoridade policial e deverá conter:
I - qualificação da ofendida e do agressor;
II - nome e idade dos dependentes;
III - descrição sucinta do fato e das medidas protetivas solicitadas pela ofendida.
§ 2o A autoridade policial deverá anexar ao documento referido no § 1o o boletim de ocorrência e cópia de todos os documentos disponíveis em posse da ofendida.
§ 3o Serão admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde.
Dessume-se do artigo supradito que se trata de importante obrigação, atribuída à polícia, consistente na formulação material do pedido da ofendida, que guarda similitude com a peça exordial de ação cautelar.
Alguns doutrinadores vêm acenando com a possibilidade da inconstitucionalidade deste artigo, uma vez que, ao permitir a vítima postular diretamente em juízo providências, tais como: afastamento do lar do seu companheiro ou cônjuge, restrições quanto à alienação de bens, direito de visitas aos filhos, porte de armas, fixação de alimentos provisórios, estaria de certa forma vulnerando o art. 133 da Constituição Federal que considera o advogado indispensável ào da justiça, portanto detentor do jus postulandi da Constituiçpresentaç administração da justiça, portanto detentor do jus postulandi. Malgrado esse pensar, ao que parece ficará insulado porque a lei em situações excepcionais pode conceder o direito da parte postular em juízo, e assim a jurisprudência vem reiteradamente se firmando, senão vejamos:
A indispensabilidade da intervenção do advogado traduz principio de índole constitucional, cujo valor político – jurídico, no entanto, não é absoluto em si mesmo. Esse postulado – inscrito no art.133 da CF – acha-se condicionado, em seu alcance, pelos limites impostos pela lei, consoante estabelecido pelo próprio ordenamento constitucional.
Portanto, é legitima a outorga, por lei, em hipóteses excepcionais, do jus postulandi a qualquer pessoa, como já ocorre na ação penal de hábeas corpus, ou ao próprio condenado – sem referir outros – como se verifica na ação de revisão criminal (STF, RTJ, 146: 49). (CONSTITUIÇÃO FEDERAL- 2002, p. 1035).
A Lei nº 11.340/2006 confere a ofendida o poder de pleitear na fase policial as medidas protetivas de urgência, autorização esta em caso de representação em situação de crime praticado contra a mulher, em que também há necessidade de medidas cíveis com reflexos na justiça criminal.
13 MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA
Ao fazer a leitura acurada dos artigos 22, 23 e 24 da lei que ora se examina, vê-se com clareza meridiana que o legislador distinguiu as medidas protetivas de urgência que obrigam o agressor das medidas de urgência à ofendida, que serão estudadas nos itens subseqüentes.
13.1 MEDIDAS PROTETIVAS QUE OBRIGAM O AGRESSOR
O art. 22 da Lei nº 11.340/06 elenca as medidas protetivas que obrigam o agressor, as quais serão estudadas de per si:
Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:
[...]
I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
A hipótese de que cuida o art. 22, I da lei é de suspensão da posse ou restrição do porte de armas a serem determinadas pelo juiz. Considerando que nos termos dos arts. 5º, § 1º e 10 compete à polícia federal, após ouvido o Sistema Nacional de Armas (SINARM), expedir registro de autorização para o porte de arma. A ordem judicial de suspensão da posse ou restrição do porte será dirigida àquele órgão. O inciso “II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida”.
Já vinha sendo empregada, no direito de família, como medida de cautela na separação de corpos, por força do art. 7º, § 1º da Lei nº. 6.515, de 26 de dezembro de 1977, sendo que a lei objeto desta monografia fez tão somente repeti-la no art. 23, inc.IV, bem como chegou a ser prevista para casos de violência doméstica, no parágrafo único do art. 69 da Lei nº. 9.099/95, a saber:
Art. 69 [...]
Parágrafo único. Ao autor do fato que, após a lavratura do termo, for imediatamente encaminhado ao Juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança. Em caso de violência domestica, o juiz poderá determinar como medida de cautela, seu afastamento do lar, domicilia ou local de convivência com a vitima. (Redação dada pela Lei nº. 10.455, de 13.05.2002).
III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;
c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;
As medidas suso expendidas, apesar de seu sentido nobre visando prevenir crimes e proteger as vítimas, encontrarão sérias dificuldades em serem implementadas, em razão da falta de estrutura estatal. Por exemplo, a fixação de distância entre agressor e agredida é uma das de difícil fiscalização. Assim como a medida constante da alínea “b”, é impossível a comprovação do conteúdo de conversas telefônicas, uma vez que Lei nº 9.296/96, em seu art. 2º, III, não permite a interceptação das comunicações telefônicas quando o fato investigado constituir infração penal punida, no máximo, com pena de detenção, que são a maiorias dos crimes cometidos contra a mulher.
Já o inciso IV do art. 22, prevê a “restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar”.
O inciso supramencionado determina a restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, o que obriga a se criar espaços públicos – nos Conselhos Tutelares, Delegacias de atendimento a mulher etc, para garantir horários de visitação acompanhada.
A lei autorizou o juiz criminal ou o do juizado de violência doméstica e familiar contra a mulher, fixar os alimentos provisionais ou provisórios, medida salutar que fortalece a mulher até mesmo para pensar quanto às demais pretensões cíveis ou criminais.
É o que se depreende da leitura do inciso V, que trata da “prestação de alimentos provisionais ou provisórios”
13.2 MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA À OFENDIDA
As medidas de urgência à ofendida estão previstas no art. 23 e seus incisos, da lei que exaustivamente estuda-se e que ora se transcreve:
Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:
I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento;
II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor;
As medidas constantes no inciso acima dependerão da existência desses programas. Há de ser apreciado com o artigo 22, II, por conseqüência lógica e por guardarem reciprocidade.
A redação do inciso III “Determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos” já é prevista no art. 888, VI, do CPC, cujo dispositivo é a chamada separação de corpos, e busca o resguardo da integridade física e moral da requerente e dos filhos.
Como já disse alhures, soma-se á medida contida no inciso supra, a separação de corpos prevista no inciso IV “Determinar a separação de corpos”, que quando deferida, deverá a ação principal de separação judicial, anulação de nulidade do casamento, dissolução da união instável ser proposta no prazo de trinta dias da efetivação da medida, conforme dispõe o art. 806 do CPC.
14 ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
A Carta Política em seu art.127, traçou o perfil constitucional do Ministério Publico, sendo relevante para a pesquisa efetuada transcrever o artigo mencionado: “O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”.
A Lei nº 11.340/2006 trouxe maior responsabilidade ao órgão ministerial, atribuindo-lhe a incumbência de requerer as medidas protetivas de urgência, conforme determina o art. 19 da referida lei, e nesse caso agindo em substituição processual da vítima. No art. 26, preceitua que ao Ministério Publico cabe:
a) requisitar força policial e serviços públicos de saúde, de educação, de assistência social e segurança entre outros;
b) fiscalizar os estabelecimentos públicos e particulares de atendimento à mulher em situação de violência domestica e familiar, e adotar de imediato, as medidas administrativas ou judiciais cabíveis no tocante as quaisquer irregularidades constatada;
c) cadastrar os casos de violência domestica e familiar contra a mulher.
Inegavelmente houve uma ampliação das atribuições do Ministério Público na esfera administrativa, que ao verificar irregularidades poderá instaurar inquérito civil embasado no art. 8º, § 1º da Lei nº 7.347/85, visando apuração de irregularidade e responsabilidade, e em seu bojo obter o compromisso de ajustamento de conduta às normas legais.
Por derradeiro incumbiu-lhe no artigo 37 a competência para a defesa dos interesses e direitos transindividuais previstos nesta lei em igualdade de condição com associação que atue na área e que esteja regularmente constituída há pelo menos um ano, nos termos da legislação civil (art. 5º da Lei nº 7.347/85).
15 COMPETÊNCIA JURISDICIONAL
O art. 33 da Lei nº 11.340/2006 preconiza que:
Art. 33. Enquanto não estruturados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, as varas criminais acumularão as competências cível e criminal para conhecer e julgar as causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, observadas as previsões do Título IV desta Lei, subsidiada pela legislação processual pertinente.
Depreende-se do artigo que as varas criminais acumularão as competências civis e criminais.
Para exame quanto a mantença do foro civil é importante citar o art. 15 da lei já mencionada:
Art. 15. É competente, por opção da ofendida, para os processos cíveis regidos por esta Lei, o Juizado:
I - do seu domicílio ou de sua residência;
II - do lugar do fato em que se baseou a demanda;
III - do domicílio do agressor.
Infere-se que a lei manteve a competência das varas de famílias e cíveis, para os processos cíveis de separação, dissolução de união estável, alimentos, execução das conciliações, etc. vigindo o direito a eleição do foro, conforme acima explicitado.
16 O PRIMEIRO ANO DE VIGÊNCIA DA LEI
A Lei nº 11.340/2006 faz parte do nosso arcabouço jurídico, tendo completado um ano de aniversario no mês de setembro de 2007, apesar de novel, sem dúvida é uma conquista de há muito aspirada pelas mulheres que durante séculos foram massacradas. A lei traz em seus comandos legais medidas protetivas de suma importância, visando até mesmo à preservação da vida da mulher.
Apesar de inovações avançadas, que visa não somente conteúdo criminal, mas proteção no âmbito do direito de família, haja vista que nem sempre a violência doméstica constituirá infração penal a ensejar a instauração de inquérito policial, sendo um mecanismo de frenagem desse tipo de violência arraigada no íntimo de um machismo que deve ser rechaçado, a lei sob comento encontrará algumas dificuldades em sua aplicabilidade por falta de políticas públicas adequadas e criação dos juizados especiais e violência doméstica e familiar em todos os Estados da Federação.
Segundo dados coletados no jornal jurídico, após a vigência da lei, 12 (doze) Estados já criaram varas especializadas em violência doméstica contra a mulher: Amapá, Distrito Federal, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Roraima, Santa Catarina, São Paulo e Tocantins (JORNAL JURIDICO, 2007).
No tocante às Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs), estas ainda são insuficientes, pois segundo dados da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, o número atual destas delegacias é 339, em um país de extensão continental como o nosso, que possui mais de 5.500 municípios, segundo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A lei susomencionada tem alcance especifico, ou seja, erradicar a violência de gênero com proteção a mulher, sendo digna de encômios, devendo ser observada respeitada e acolhida no mundo jurídico, especialmente pelos Tribunais Pátrios, mormente que a lei também protege a família, e considerando que na maioria das vezes a mulher vitima não deseja submeter o marido, namorado, companheiro ou convivente ao processo penal, mas somente a garantia estatal em momentos de extrema dificuldade e urgência, podendo ser exercitado o seu direito como um instrumento de valorização pessoal e obstar a violência contra si praticada, consequentemente, vindo em algumas situações manter ou restabelecer a relação afetiva.
REFERÊNCIAS
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18 nov. 2007.
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BRASIL, Vade Mecum, 2. ed. Saraiva, 2006.
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EÇA DE QUEIROZ, José Maria – O Crime do Padre Amaro. Tradução de Fernando Paixão. 15. ed. São Paulo: Ática, 2000
.FEU ROSA, Antonio José Maria. Considerações sobre prisão preventiva. A Tribuna, Vitória, p. 23, 26/08/2007.
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. , JESUS, Damásio Evangelista, Lesão Corporal, disponível em: <.http://www.jurisway.org.br/> – 2006 (faltou dia de acesso).
MIRABETE, Julio Fabbrine, Código de processo penal comentado, 4. ad. São Paulo: Revista dos tribunais
NUCCI, Guilherme de Souza, Código de Processo Penal Comentado, 4 ed, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005.
NUNES,Pedro dos Reis, Dicionário de tecnologia jurídica, 6 ed. Rio de Janeiro, Livraria Freitas Bastos, 1965
PORTO, Pedro Rui da Fontoura, Violência doméstica e familiar contra a mulher: Lei 11.340/06 análise crítica e sistemática, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007
Revista jurídica Consulex – Ano X, nº. 233, acesso em: 28 set. 2006
Revista Jurídica Consulex – ano X, nº. 237, acesso em: 30 de nov. 2006
SOUZA, Sergio Ricardo. Comentários à lei de combate a violência contra mulher Curitiba: Juruá, 2007.
SANCHES, Rogério Cunha, PINTO, Ronaldo Batista , Violência Domestica, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
Monografia apresentada ao curso de Direito do Centro de Ensino Superior de Vitória (CESV), como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em Direito.

À meu esposo Valter e as minhas filhas Priscila e Brunelly.
A Deus, princípio e fim de todas as coisas.

AGRADECIMENTOS
Primeiro a Deus, sem o qual nada teria sido possível.
Meu especial agradecimento ao Valter, meu esposo que tanto amo; e as minhas filhas pela compreensão e pela colaboração que me foi prestada durante os meus estudos.
A Professora Lígia Maria Coelho da Silva, pelos ensinamentos, pela compreensão e pela valiosa orientação que me foi dispensada durante a execução do presente trabalho.
Agradeço em especial a amiga Nathália Cafezakis dos Santos, pelo trabalho incansável e perspicaz na produção; e a minha orientadora Christiany Frasson.da Silva Souza, pela paciência e carinho.
Meus agradecimentos, ainda, a todos aqueles que de alguma forma contribuíram na execução do presente trabalho.


Autora:Mara Da Silva Ribeiro
ribmara@gmail.com
VITÓRIA - 2007
Orientadora: Profª. Christiany Frasson.da Silva Souza
CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DE VITÓRIA (CESV)

terça-feira, 21 de julho de 2009

Elementos fundamentais do processo penal

PRINCIPIOS DO PROCESSO PENAL
PROCESSO PENAL
marasaberdireito@hotmail.com

OBS: ( O Rol de princípios do Processo penal, não são taxativos e sim exemplificativos).

O primeiro principio do Processo Penal a ser tratado, é o Principio da Imparcialidade do Juiz.

Isso porque o Juiz situa-se na relação processual existente entre as partes e sua imparcialidade é tão importante que é erigida à condição de pressuposto para constituição de uma relação processual valida. É dizer sem imparcialidade, não há relação processual valida. Para assegurar essa imparcialidade, a Constituição Federal assegura algumas garantias, que são aquelas prescritas no art.95 (Vitaliciedade – só perdendo o juiz o seu cargo em decorrência de sentença judicial transitada em julgado,Inamovibilidade e irredutibilidade de subsídios), também prescrevendo algumas vedações (art.95, parágrafo único) e proibindo juízes e tribunais de exceção (art.5º XXXVII), o que significa em linhas gerais ninguém poder ser julgado por órgão constituído após a ocorrência do fato a que se visa julgar.

Outro principio é o da igualdade processual: trata-se de desdobramento do principio da igualdade, pelo qual são todos iguais perante a lei. Com efeito, devem as partes ter em juízo as mesmas oportunidades, devem ser tratadas de forma equânime, isto é, de forma igual. Este principio, é bom dizer, sofre algumas atenuação pelo fato de vigorar no processo penal com extraordinária força o principio do favor rei, pelo qual gozam de interesse preponderante no processo penal os interesses do réu quando em contraste com a pretensão punitiva do Estado.

Ainda falando do princípio do favor rei, trazendo exemplos de benefícios à defesa prevista na legislação processual penal, temos o art. 621, do CP, que fala da revisão criminal, algo muito parecido com a ação rescisória do cível e que se destina à revisão de possíveis erros judiciários ocorridos após o transito em julgado da sentença penal condenatória.

O Principio da paridade de armas. Por esse principio, entende-se que uma das partes no processo não pode ter benefícios exagerados que coloquem a outra em situação de preterimento.
De tal forma, alguns desses institutos passam a ter nova interpretação. É o caso do art. 386, VI do CPP, que fala da absolvição do acusado em caso de insuficiência de provas. Tem sido sustentado que não é qualquer dúvida que possibilita a absolvição do réu, pois a dúvida, por mínima que seja, é normal em qualquer julgamento e assim somente a dúvida clamorosa é que possibilitaria a absolvição.

Falar de principio de paridade de armas é também falar de outro principio, também muito importante, que é o Principio do Contraditório: Muito falado e também muito estudado, o principio do contraditório deve ser compreendido pelo binômio ciência e participação.
Principio do contraditório = ciência + participação.

As partes pelo principio do contraditório têm direito de serem cientificadas sobre qualquer fato processual ocorrido e também devem ter a oportunidade de sobre ele se manifestar. É o que decorre da redação do art. 5º, LV da CF. Pois bem, a ciência dos atos processuais é dada pela citação, intimação e notificação.

Citação é a cientificação a alguém da instauração de um processo, com a conseqüente chamada para integrar a relação processual.

Intimação essa se refere a atos já realizados no processo (sentença, acórdão, manifestação sobre a prova realizada) enquanto que a :

Notificação é referente a algum ato futuro (dia de audiência, dia de sessão, etc.).



Principio da ampla defesa: o Estado deve proporcionar a todo o acusado a mais completa defesa, seja pessoal (autodefesa), seja técnica (efetuada por defensor), também devendo prestar assistência jurídica integral e gratuita aos necessitados (art.5º LXXIV). É interessante notar que no processo penal este principio é materializado, por exemplo, pela obrigatoriedade de realização do interrogatório, que é a oportunidade de dar o acusado ao juiz sua versão dos fatos a ele imputados e contidos na denuncia, que é a peça acusatória inicial.

Principio da disponibilidade ou da indisponibilidade da ação penal: prevalece no processo criminal o principio da indisponibilidade, ao contrario da disponibilidade de direitos, que, regra geral, vigora no cível. Ora, o crime é uma lesão irreparável e daí decorre o dever do Estado fazer valer o seu poder coercitivo contra quem infringe as regras por ele postas.

Principio da oficialidade: os órgãos incumbidos da persecução penal não podem ser privados. Não há por exemplo, no processo penal a possibilidade de se iniciar ação penal por investigação levada a cabo por detive particular. Mais a Constituição Federal consagra o principio da oficialidade ao dispor que a ação penal pública é privativa do Ministério Público (art.129,I da CF) e que a função de policia judiciária incumbe à policia civil (art.144,§ 4º,c,c o art.4º, do CPP).

Principio da oficiosidade : atenção!!!, não confundir com o principio da oficialidade.

O PRINCIPIO DA OFICIOSIDADE entende-se por ele que as autoridades públicas devem agir de oficio, isto é sem necessidade de provocação ou de consentimento de quem quer que seja. Exceção; ação penal pública condicionada a representação ou requisição e ação penal privada, pelas quais somente se inicia a persecução caso haja interesse por parte da vitima, diferentemente do que ocorre nas ações penais públicas incondicionadas em que a persecução penal se inicia independentemente da vontade da vitima.

Principio da verdade material ou real, característico do processo penal, dado o caráter público do direito material envolvido. Com efeito, por esse principio é dever do juiz superar a iniciativa probatória das partes, esgotando todas as possibilidades para alcançar a verdade real dos fatos. Opõe-se ao principio da verdade formal, pelo qual deve o juiz contentar-se com prova produzida pelas partes ,o que costumeiramente ocorre no processo civil. ( verificar o que diz o art.156 do CPP, ícone da verdade real no processo penal: o juiz poderá, no curso da instrução ou antes de proferir sentença, determinar, de oficio, diligencias para dirimir dúvidas sobre ponto relevante. Há exceções, entretanto no processo penal e especialmente nos casos de procedimento do júri, Vejam o art. 475, do CPP, que proíbe a exibição de prova no plenário do júri em dadas condições.

Principio da persuasão racional do juiz: o juiz só decide com base nos elementos existentes no processo, mas os avalia segundo critérios críticos e racionais, devendo observar as regras legais. É dizer: o juiz não decide sem explicar as razões pelas quais concluiu algo, precisa demonstrar porque acha isso ou aquilo e de forma racional, isto é usando a razão

Principio da motivação das decisões judiciais: sem duvida que esse é um dos princípios mais importantes e vem desc rito no art. 93, IX, da CF.
Por ele se assegura a toda a sociedade a visão da imparcialidade do juiz, a legalidade e a justiça das decisões judiciais.

Correlato a esse principio está o principio da publicidade, também descrito no art. 93, IX da CF e por ele se garante a todos o conhecimento das decisões e atos do Poder judiciário em geral.
Atenção: a publicidade dos atos do processo não é absoluta, isto é, haverá casos em que ela poderá ser restringida diante de algum valor que em dado momento se mostre mais importante.

Principiio do juiz natural (art.5º, XXXVII e LII): embora dele já tenhamos cuidado quando falamos da imparcialidade do juiz, é bom que se diga que a garantia do juiz natural encerra o conceito de que ninguém poderá ser julgado senão pelos juízes que eram competentes para o julgamento na época em que o fato foi praticado. O contrario do juiz natural é o juízo de exceção e a história humana está repleta de exemplos de tribunais de exceção. Veja-se, por exemplo o famoso Tribunal de Nuremberg criado pelos aliados para julgar os crimes do regime nazista, que é considerado juízo de exceção por não existir na época dos fatos por ele julgados.

Principio da inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos (art.5,LVI): as provas ilícitas são espécie de gênero provas verdades e por esse principio proíbe-se no processo penal a admissão de provas produzidas com infringência a normas do direito material, como são por exemplo a busca e apreensão realizada sem autorização judicial, a interceptação telefônica clandestina, a quebra do sigilo epistolar, a tortura etc. Atenção: inclina-se a jurisprudência de forma tranqüila quanto à admissibilidade da prova ilícita, mesmo diante da vedação constitucional, quando vem esta a beneficiar a defesa por preponderar no caso concreto o status libertatis, o principio da dignidade da pessoa humana. Para essa corrente prestigiada pela doutrina majoritária, a vedação constitucional dirige-se às provas ilícitas quando prejudiciais à defesa, porque em tais casos não poderia o jus puniendi do Estado valer – se de atos ilícitos em prejuízo da defesa. A jurisprudência também tem entendido que também seriam ilícitas as provas originariamente licitas. Mas que se tornariam ilícitas por derivarem de provas ilícitas. É a famosa teoria dos frutos da arvore envenenada.
Outro principio é o principio da celeridade processual, que muitos acreditam só vigorar no cível. Ledo engano. No processo penal, é certo dizer toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável.
Não é ensinamento doutrinário,não Agora é garantia constitucional. Vejam para tanto o que dispõe o art. 5, LXXVII, inserido pela emenda constitucional 45.

Duplo grau de jurisdição, que muitos julgam tratar-se de principio constitucional em verdade não se trata de principio constitucional, pois não há na Constituição Federal em nenhum lugar qualquer menção que garanta a todos o duplo grau de jurisdição. Em verdade, o que chamamos de duplo grau de jurisdição nada mais é do que possibilidade de em alguns casos haver recursos das decisões judiciais, mas não que isso seja uma garantia constitucional.
Sabemos que algumas pessoas por causa do cargo que ocupam têm direito a serem julgadas por órgãos jurisdicionais distintos. Que dizer então daquelas pessoas que são julgadas originariamente pelo STF? A quem iriam recorrer em caso de derrota? A ninguém,obviamente, o que comprova não ser o duplo grau de jurisdição garantia constitucional, mas sim uma decorrência da existência em nosso,ordenamento jurídicos de órgãos judiciais de 1ª,2ª instâncias e instâncias superiores.
Principio do estado de inocência, por ele ninguém será considerado culpado até o transito em julgado da sentença penal condenatória (art.5º,LVII).Assim, no processo penal, decorrência desse principio, quem deve fazer prova da culpa do acusado é a acusação, o Ministério Publico nas ações penais públicas ou o querelante nas ações penais privadas, sendo errado e muito errado dizer que o réu deve fazer prova de sua de inocência. Repito: é o Estado que deve fazer prova da culpa do réu e isso é decorrência de que todos são considerados inocentes até que se prove o contrário.

sábado, 18 de julho de 2009

DIREITO PENAL - INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA

INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA

A interceptação telefônica é a gravação, a captação de conversa telefônica e ocorre quando, em momento algum, nenhum dos interlocutores tem ciência da invasão de privacidade, torna-se importante frisar este conceito para que não venhamos confundir interceptação telefônica com gravação clandestina da conversa telefônica, pois nesta última, um dos interlocutores sabe que a gravação se realiza.

Enquanto a interceptação telefônica é amparada pelo direito, se obedecidos os parâmetros delimitados em lei, sendo, portanto, um meio de prova licito, a gravação clandestina da conversa telefônica é ilícita e inadmissível como prova no processo.

constituição Federal consagra, no inciso XII,do art.5º a inviolabilidade da correspondência e das comunicações telegráficas de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.

Entende-se que quando o texto acima transcrito ressalta no último caso, este quer dizer neste último caso e faz referência à inviolabilidade das comunicações telefônicas, que é o objeto primordial deste assunto.

Apesar da regulamentação feita pela Carta Magna, notamos que nenhuma liberdade é totalmente absoluta e existe indubitavelmente a possibilidade de violação das comunicações telefônicas, desde que, forem respeitados os requisitos legais.

A Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996, veio para regulamentar o inciso XII, parte final do art.5º, supramencionado; tal lei determina a forma de se realizar a interceptação. O art. 1º, parágrafo único, da referida lei declara que seu disposto aplica-se à interceptação do fluxo de comunicação em sistema de informática e telemática.

Importante revelar que para haver a possibilidade da interceptação telefônica, três requisitos necessariamente devem apresentar-se:
1. Ordem judicial
2. Nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer;
3. Para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.

Deve-se ressaltar que somente por ordem do Juiz competente da área criminal, ocorrerá a realização da ação principal da interceptação e sob segredo de justiça. O segredo faz-se necessário, pois evita que o assunto possa chegar ao conhecimento de pessoas interessadas, conseguintemente, frustrando o objetivo da atividade pretendida,ou seja,a necessária apuração da infração penal. Por isso,se tal sigilo for quebrado, provavelmente não se conseguirão resultados positivos para prova do crime.

A Lei nº 9.296 de 24 de julho de 1996 delimita que não será admitida a interceptação se não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal, assim como quando a prova puder ser feita por outros meios disponíveis (mostrando-se uma medida de exceção) e se o fato investigado constituir infração penal punida, no Maximo, com pena de detenção.